top of page
Buscar
  • Foto do escritorSerena Franco

Marvin Bell (Nova York 1937)



Sobre o início do homem morto


Quando o homem morto vomita, ele pensa que vê sua vida interior.

Ao ver seu vômito, ele pensa que vê sua vida interior.

Agora ele pode se desmontar, pesar os ingredientes, pensar sua maquiagem.

Ele quer estudar as coisas fora de si mesmo, se conseguir encontrá-las.

Movendo-se, o homem morto emite o som de ossos sobre ossos.

Ele dobra um joelho que não quer se dobrar, ele levanta um braço que discute com um ombro, ele vira a cabeça atirando-a selvagemente para o lado.

Ele inveja a lagosta pelas luvas que protegem seus membros.

Ele acredita que a água-viva tem vida fácil, flutuando, deixando tudo passar por ela.

Ele gostaria de ser uma estrela do mar, admirada por sua forma muito tempo depois.

Tudo o que o homem morto disse, ele agora retira.

Não como um jovem vigoroso demonstra sinceridade ou arrependimento.

Um jovem morto e um velho morto são duas coisas diferentes.

Um jovem morto é petróleo, um velho morto é água.

Um jovem morto é pão e manteiga, um velho morto é pão e água - a diferença está na construção, também na arquitetura.

O homem morto estava lá no início: para o homem morto, o céu é um cadinho.

Na vida do homem morto, o planeta mudou da lava para as cinzas para o cimento.

Mas o homem morto bate as penas, levanta suas asas sobre a cabeça e elas se tocam, 

ele se dobra com seu bico ao chão, ele se dobra e se desdobra na linha  do vinco de sua armadura.

O homem morto está aberto à mudanças e tem bolsos fundos.

O homem morto é o único que viverá para sempre.







Sobre o homem morto e o bumerangue


O homem morto fica parado, esperando que o bumerangue - você sabe.

Ele ouve a palavra dos filósofos ricochetear entre os abismos e desaparecer ao longe.

Seu cheiro vai adiante, sua pele velha, seus cabelos e unhas, e ele também cospe.

Ele se inclina para frente para olhar para trás, e o mundo antigo ressurge.

É o começo, quando montanhas, cânions e mares eram novos,

antes que a lua tivesse olhos, antes do papel, antes da crença.

Quaisquer palavras que ele pronuncie agora são lembranças do futuro.

Elas serão destinadas a evitar o retorno de uma peste.

Elas terão o objetivo de unir um caminho que deverá ser trilhado no escuro.

O homem morto perguntará por quem você está lutando, você sabe, será que isso vai voltar para assombrar você?

Ele perguntará sobre o sabor das cinzas, ele perguntará se você se lembra.




4 visualizações0 comentário

Posts recentes

Ver tudo

Mary Jo Bang (Missouri 1946)

Teoria da catástrofe III Agora nos sentamos e brincamos com um elefantinho de brinquedo que percorre um fio esticado. Agora somos usados e nos usamos uns aos outros, em turnos. Nossos chapéus desemara

Rafael Espinosa (Lima 1962)

Por ter parentes em todos os lugares, como qualquer semente transgênica melancólica, não é garantido que formemos, via o que eles beijam e abraçam, um clube íntimo com o planeta. Nós teríamos também q

Eliot Weinberger (Nova York 1949)

LACANDONES Na selva de Chiapas, dorme-se em cabanas de palha sem paredes, em redes que mal se mexem. Ali se diz: Se você sonha com um burro, haverá muito vento. Se você sonha com tacos, verá um tamand

bottom of page